sábado, 20 de dezembro de 2008

FRAUDE MILIONÁRIA




Superintendente do Incra é preso
19 prisões foram decretadas pela Justiça Federal e esquema é apontado pelo MPF como um dos maiores já vistos em Mato Grosso

Procurador Avelar diz que vai precisar de pelo menos dois anos para levantar prejuízos Silvana Ribas Da Redação
Quatorze pessoas acusadas de integrarem uma quadrilha formada por servidores do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Mato Grosso foram presas ontem, pela Polícia Federal. Entre elas o superintendente do órgão, João Bosco de Morais, e o procurador Antônio Reginaldo Galdino Delgado, preso recentemente na operação "Dupla Face", que já investigava a corrupção. São nove servidores do Incra e 10 proprietários rurais, comerciantes e madeireiros que participaram do esquema fraudulento. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), somente em um, dos 600 projetos de assentamentos investigados, o prejuízo com indenizações supera os R$ 14 milhões. "Acredito que vamos precisar de pelo menos dois anos de investigação para levantarmos quantos milhões foram lesados dos cofres públicos", disse o procurador federal Mário Lúcio Avelar.
O ressarcimento aos cofres virá em um segundo momento. Avelar disse que o importante agora é desarticular a quadrilha. "Agora o Incra vai funcionar, em Mato Grosso, dentro da Polícia Federal", assegurou.
A ação do grupo se concentrava em falsificar documentos das áreas, transferindo-as para terras devolutas da União ou do Estado, beneficiando os "supostos" proprietários com indenizações milionárias, a pretexto de promover assentamentos. Ao todo foram pedidas 19 prisões pelo MPF, decretadas pelo juiz da 1ª Vara, Julier Sebastião da Silva. Até o final da tarde de ontem, 14 delas haviam sido cumpridas em Cuiabá, Várzea Grande, Cáceres, Sinop, Novo Horizonte (SP), Amambaí (MS) e Tupassi (PR).
Avelar assegura que a quadrilha agia dentro do Incra com o conhecimento tanto da administração regional, como nacional. "É preciso que o Governo Federal coloque pessoas decentes para administrarem o órgão ou pelo menos feche o Incra até que consiga moralizá-lo".
Ele diz que nacionalmente a média de fraudes em processos gira em torno de 53% e, em Mato Grosso, chega a 80% nos processos de assentamentos. Lembra que metade das denúncias investigadas pelo MPF em Mato Grosso estão relacionadas a irregularidades no Incra. O procurador diz que nos moldes que atua, o Incra de Mato Grosso está prestando um desserviço à reforma agrária e tirando milhões em recursos de Programas Federais voltados para assentamentos, em benefício da quadrilha.
As prisões foram decretadas com base em investigações do MPF em processos relativos a desapropriação de seis áreas. Há denúncias contra processos iniciados desde 1998. Segundo o MPF, auditorias internas do Incra e do Tribunal de Contas da União (TCU), nos últimos anos, já apontam para o esquema de montagem de processos que possivelmente beneficiaram "laranjas" do grupo, que repassariam os valores das indenizações para os "autores dos projetos".
A ousadia do grupo em emitir laudos técnicos fraudulentos, inclusive para responder a questionamentos do MPF e da Justiça, era rotina. Um dos casos, aponta Avelar, é a justificativa dos técnicos do órgão para a desapropriação de mais uma área na região de Confresa, onde haviam outros processos em andamento. O motivo era que o município crescia 15% ao ano, gerando uma demanda grande de assentamento, dado este irreal.
Desmatamento - As fraudes nos processos geravam a ocupação das áreas desapropriadas por pessoas que não eram clientes da reforma agrária. A maioria das fazendas estava situada em área de floresta, onde apenas 20% da mata poderia ser derrubada. Os solos são inadequados para o cultivo o que fazia que a propriedade acabasse sendo ocupada por madeireiras, que contribuíam para o desmatamento da floresta. Avelar acusa esta política do Incra de ser a principal responsável pelo desmatamento da Amazônia.
Além disso, os verdadeiros clientes da reforma agrária, acabavam se tornando empregados de madeireiros ou fazendeiros, pois não tinham como sobreviver do trabalho nas terras inadequadas. Avelar diz que graças a atuação da quadrilha, a situação nos assentamentos do estado é precária, aos moldes do que acontece na região de Marabá. Mais de 90% deles não possuem energia elétrica, 95% não têm postos de saúde e 100% não contam com escolas. Não tem água tratada e nem armazéns.
Dupla Face - Em agosto deste ano a operação "Dupla Face", da Polícia Federal, prendeu 32 pessoas acusadas de corrupção passiva e formação de quadrilha que atuavam dentro do Incra. Destas, 12 foram denunciadas pelo Ministério Público Federal. Entre os presos e processados estava o procurador do Incra, Antônio Reginaldo Galdino Delgado, acusado de receber propina para dar parecer favorável aos interesses da quadrilha. Além do procurador, também vão responder a processo Emerson Rossi de Barros, Antônio José Cintra Filho, Antônio Luiz de Souza Meira, Carlos Leite Filho, Cláudio Maurício Barroso de Brito, Domingos Sávio Santana, Itamar Moreira de Souza, Joamir Santana Duarte, José Nicolau Fuezi Leite de Oliva, Osvaldo das Neves Viana e Rogério Beghini.
Outro lado - Ontem, logo após as prisões, o Incra de Mato Grosso fechou as portas. Em nota oficial, a direção nacional do órgão informou que ontem mesmo exonerou o superintendente regional e que as investigações do MPF foram iniciadas a partir de solicitação do próprio Incra Nacional. Na nota, o Incra informa que seguirá prestando toda a colaboração necessária à PF e ao MPF para a conclusão das investigações.
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