quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Sanecap investiga esquema de funcionários com empresas que fornecem água para lucrar com a falta do líquido na Capital


Favorecimento aos ‘pipas’

Geraldo Tavares/DC


RENÊ DIÓZ
Da Reportagem

A Companhia de Saneamento da Capital (Sanecap) abriu nesta segunda-feira uma sindicância para investigar um suposto esquema armado por funcionários e empresas de caminhões-pipa com o objetivo de lucrar em função da falta d’água durante a seca. Segundo a denúncia que motivou a sindicância, funcionários da Sanecap estariam recebendo propina de empresas de caminhões-pipa para deixar de abastecer bairros da cidade.

A denúncia partiu de moradores e foi encaminhada pelo vereador Toninho de Souza, que a apresentou na tribuna da Câmara Municipal, e para a direção da Sanecap na semana passada. Em síntese, os moradores apontam técnicos da manutenção do abastecimento como responsáveis por interromper o fluxo d’água de propósito em algumas partes.

O esquema, segundo Souza, passou a funcionar justamente a partir de meados de setembro, período de estiagem rigorosa, de forma que os moradores de 30 a 40 bairros ficaram sem opção a não ser recorrer aos caminhões-pipa. “Estourou uma falta d’água inexplicável em Cuiabá. São pessoas ganhando em cima do sofrimento da população”, sentencia Souza.

Alguns fatos realmente intrigam nesta história. O vereador conta que a denúncia foi manifestada na tribuna da Câmara na última quinta-feira. Até lá, o atendimento por telefone da Sanecap recebia cerca de 100 ligações, segundo ele, de pedidos de caminhões-pipa por falta de abastecimento. Porém, na sexta-feira, o vereador conta que houve apenas um pedido. “Além disso, se tem água para o caminhão, como não tem para a população que paga para tê-la em casa?”, questiona.

Isso porque, atualmente, a própria Sanecap tem alegado que a rede de abastecimento da cidade está funcionando sem grandes problemas estruturais. Pelo contrário, está reforçada pela ETA Tijucal. No último dia 21, o Diário repercutiu com a empresa reclamações a respeito do abastecimento. Ainda que tivesse recentemente concluído obras de adutoras em alguns bairros, a Sanecap alegou que os rios da cidade estavam em níveis satisfatórios, que não havia problemas estruturais e que eventuais faltas d’água teriam como explicação o consumo acima da média. E uma reportagem anterior, no início de setembro, entrevistou quatro empresários de caminhões-pipa afirmando que sua demanda estava mais alta que a capacidade de atendimento.

CONDOMÍNIOS - Grande parte dessa demanda seria dos condomínios residenciais, pelo menos segundo a denúncia encaminhada por Toninho de Souza. Eles seriam os principais alvos do suposto esquema criminoso, pois seus moradores – que pagam taxas mensais incluindo o preço da água consumida –, diante da falta d’água, recorrem em peso à figura do síndico, que precisa tomar providências rápidas.

É o caso do residencial Topázio, no bairro Terra Nova, com 102 apartamentos em seis blocos. Desde o dia 12 de agosto as faltas d’água ficaram estranhamente frequentes, como relata o síndico Néio Lúcio Monteiro Lima. Antes, os períodos eram de até três dias, mas passaram a se estender por até oito, obrigando o síndico a contratar caminhões-pipa que, até hoje, já sugaram cerca de R$ 10 mil dos moradores, além da conta mensal de água. O condomínio exigiu ressarcimento por quatro vezes. Nunca houve resposta, o que não parece mesmo ser o forte da empresa, segundo o síndico. “O 115 não atende e os funcionários não estão preparados para dar respostas”. Perguntado se acredita na existência de algum esquema que favoreça as empresas de caminhão-pipa, o síndico alega que “hoje, na atual conjuntura política, tudo é possível”.

Por sua vez, o diretor técnico da Sanecap, Álvaro Luiz Gonçalves, informou que a falta d’água em Cuiabá ocorre de maneira localizada e por problemas de ordem técnica, mas que a sindicância instaurada já está em andamento e que a situação do Topázio já foi regularizada.

O prazo da sindicância é de 15 dias para se manifestar sobre a suposta fraude.